HOMENAGEM


Homenagem



Aos quatro ou
cinco anos, eu era uma garotinha que já gostava de fazer versos. Parece que eu
encerrava as minhas “apresentações” sempre com a mesma frase: bonecas no meu
coração. Tudo a ver com a minha paixão do momento...
Ao longo de
minha vida ouvi meu pai repetir esta estória. Aliás, sempre com muita alegria e
orgulho da “precocidade” da primogênita.
Por isso, o
título do blog é uma homenagem a meu pai, Humberto Narbot.

terça-feira, 26 de março de 2013

O CÃO


Era um cão sem raça e sem dono, que perambulava pelas ruas do bairro. Mas não era um cão vadio qualquer, tinha até nome, dado pelos moradores: Zé.

Dizer que era sem raça, era até ofensa. Não tinha pedigree, é certo, nem características definidas de raça alguma. Mas tinha ares altaneiros, altivos, de quem sabe quem é e o que quer.

Vadio não era. Apenas livre, sem peias nem coleira. Por isso vagava sobranceiro, nobre, digno, observando o mundo ao seu redor. Ninguém lhe impunha os rumos do passeio, nem lhe dizia quando era chegada a hora de parar. Decidia tudo isso por si mesmo, o Zé. Era seu dono.

Dizer que era sem dono, equivale a dizer que era sem teto, e também sem alguém que lhe provesse o de-comer. Em termos. Por não ter um dono fixo e obrigado a dar-lhe sustento, encontrara vários.

Sem-teto, mas não invasor. Fica à espera, do lado de fora dos portões, que tem noção de propriedade e privacidade. Quando alguém saía porta a fora, Zé o encarava com seus olhos mansos, ternos, quase humanos. Era praticamente certo que aquele a quem o olhar fora dirigido, voltasse sobre seus passos em busca de algo para o Zé.

Irresistível, o olhar do Zé. Os moradores dos apartamentos, de suas janelas e varandas, vendo o Zé a passear, desciam com a merendinha para o cão. Até porteiros e faxineiras dos edifícios, sabendo que ali era possível rota do Zé em seu passeio, deixavam discretamente na calçada, um pratinho de comida e uma tigelinha de água. Bem mimado, esse Zé, cão sem dono só no nome.

E assim seguia o Zé, sem dono mas alimentado, livre, escolhendo a cada noite o cantinho de rua onde pousar a cabeça e dormir. Pela manhã, repousado, retomava sua vida de andarilho, de explorador das belezas do mundo.

Tornara-se conhecido no bairro, personagem típico, saudado por todos os que por ele passavam. Os homens, presos a inúmeros compromissos, apressados na luta pela vida. Zé, o sábio, calmo e tranquilo em seus vagares, na certeza de que alguém proveria o de que necessitasse. Levava sua vidinha de cão.

Um dia, o Zé sumiu. A gente passava pelas ruas e não o via. Aos portões das casas e edifícios, pratinhos cheios, mas abandonados. As pessoas às janelas, procurando ver se o Zé aparecia, preocupadas com o que lhe teria sucedido, se estaria alimentado, doente. Será que foi pego pela “carrocinha”?

Cadê o Zé?

Não sabemos o que houve com ele, se foi desta para melhor, embora parecesse bem satisfeito com esta, não procurando melhor. Ou só mudou de bairro, buscando novas paisagens, novas gentes? Pode dar-se que em outro bairro, cansado de ser solitário, tenha encontrado outro cão por companhia. Ou então, em outra área, tenha sido tratado com mais consideração e carinho, o que não creio possível, visto que aqui era muito bem tratado e considerado. Mas, se assim foi, foi deste (bairro) para melhor...

3 comentários:

  1. Lindo conto! Cães sempre são maravilhosos. Penso que ele mudou de bairro e logo mudará de cidade. O Zé também tem sonhos. Um abraço com carinho.

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