As palavras, para mim, são, não apenas seres vivos,
mas seres mágicos, fadas ou duendes, não sei. Possuem, com certeza, uma varinha
de condão que lhes permite transformar e interpretar praticamente tudo.
Palavras são capazes de transmitir emoções,
sentimentos. Com palavras amamos, brigamos, fazemos as pazes. Através delas
magoamos ou consolamos, estimulamos ou derrotamos. Palavras podem unir ou
separar.
Usando as palavras “pintamos” uma paisagem,
“desenhamos” uma cena, traduzimos um estado de espírito, narramos uma história,
resumimos uma vida.
Dizem que uma imagem vale mais que mil palavras. Pode
ser. Um por-do-sol sobre o mar tem mais riqueza na imagem que no relato. Mas
uma foto de alguém não poderá transmitir, em plenitude, o sentir do momento,
objetivo que as palavras cumprem. Por isso, creio que palavra e imagem se
equivalem, sem supremacia de nenhuma; cada qual em seu lugar, com sua função.
As palavras nos transportam no tempo e no espaço.
Mergulho nelas e desembarco na Bahia de Jorge Amado, na Londres de Agatha
Christie, na Rússia de Dostoievsky, na Paris de Molière. Sinto com elas as
angústias de Baudelaire, vivo a Comédie Humaine de Balzac. Mergulho novamente e
chego aos dias atuais, penetrando a Fortaleza Digital de Dan Brown. Viajei
tranquilamente, sem sair de minha poltrona confortável.
As palavras, como nós, nascem, envelhecem e morrem,
porque entram em
desuso. Alguém lá sabe o que é vitupério? Surgem novas, a
definir novas tecnologias, novos estilos de vida.
Lembro-me de meus tempos de criança, a brincar com as
palavras em “descrições” e narrativas.
Naqueles tempos de antanho, em que ainda não haviam
nascido as palavras multimídia, deletar, etc., nosso sonho de consumo era uma
caneta-tinteiro Parker 51, supra-sumo do luxo ao escrever. Com uma destas,
ficaríamos livres daquelas canetas de pena móvel, que era necessário molhar no
tinteiro colocado em compartimento próprio na carteira escolar. Se tivéssemos a
tal Parker, mãos e roupas poderiam conservar-se livres de manchas de tinta! A
esferográfica, revolucionária, só surgiria depois, já na minha adolescência.
Naquela época em que o papel era rei, semanalmente a
professora colocava à frente da classe, num cavalete, um quadro com alguma cena
que tínhamos que descrever, ou sobre a qual deveríamos criar uma história.
Concentrados, buscávamos as palavras mais bonitas que conhecíamos.
Na volta das férias, era certo que seríamos intimados
a relatar as experiências vividas, as viagens, na tradicional redação “Minhas
férias”. Os mais pobres, cuja viagem não ultrapassava o campinho de futebol do
bairro, usavam a imaginação e as palavras para descrever sua maravilhosa estada
à beira-mar, ou a visita à fazenda da vovó. A narrativa vinha tão cheia de
detalhes que quase se podia sentir o cheiro da maresia, ou ouvir o mugido das
vacas...
Ah, as palavras... Que poder de sedução elas têm!
Gosto tanto delas, que sempre tive mania de fazer listas de palavras bonitas ou
sonoras.
Bruma, por exemplo, me envolve em névoa, de verdade.
Brisa me acaricia e me transporta ao mar. Bombom adoça minha boca. Onda me
embala docemente e me faz lembrar de sonhar...
É assim que as palavras me penetram, me envolvem, me
despertam. Vivo nelas e elas vivem em mim...