No meu tempo...
Eta expressãozinha mais besta!
Já morri? Não? Então o tempo de hoje também é meu.
Por que a gente, que já nasceu há algum tempo, há de
se excluir dos tempos que correm, como se fossemos mortos-vivos a assombrar os
mais jovens?
Na vã e fútil tentativa de afirmar que antigamente,
sim, as coisas eram boas, acabamos nos isolando da vida, marginalizando-nos
voluntariamente das boas coisas modernas que ocorrem à nossa volta.
E será que, antigamente, tudo era mesmo tão melhor?
Duvido. Havia algumas coisas melhores, mas também as havia piores. Bobagem
querer insistir que vivíamos no melhor dos mundos.
Acontece que o tempo lança sobre o passado um véu
dourado, e é sob este véu que visualizamos aquilo que ontem vivemos. Embaçado
pelos anos e pela nossa própria má visão, os tons dourados imperam, e o passado
fantasiado torna-se perfeito.
Por outro lado, como em nossa juventude ouvimos de
nossos pais e avós que no tempo deles, sim, é que tudo era bom, agora queremos
ir à forra. Então nos vangloriamos do “nosso tempo”, azucrinando nossos filhos.
Afinal, chegou a nossa vez de atormentar os outros...
Se parássemos para refletir, talvez conseguíssemos
enxergar a realidade do tempo “antigo” e não as fantasias que colocamos nele.
Lembra-se do telefone nos anos 50? Talvez não se
lembre, porque poucos possuíam essa comodidade em casa. Para telefonar
dependia-se da boa-vontade do dono da padaria, da farmácia, do armazém... Porque
nem “orelhão” na esquina havia. Uma ligação para outra cidade, então, demandava
horas de espera. Conforme a distância, mais rápido pegar um ônibus e dar o
recado pessoalmente...
Televisão, só preto-e-branco, e com chuvisco...
Fim-de-semana era um tal de os homens da casa subirem ao telhado para mexer na
antena pra lá e pra cá. E a gente cá embaixo a gritar: agora piorou, muda o
lado; isso, está começando a melhorar; ih!, piorou de novo... E lá se ia o
sábado, sem que ninguém conseguisse ver o futebol! Bem que a gente tentava, até
Bom-Bril na antena interna se colocava, numa última e desesperada tentativa de
se ver alguma coisa...
Será mesmo que era melhor?
Mais crianças sem escola, mais analfabetos,
mortalidade infantil maior... Sei não...
Mas a gente tem mania de dizer “no meu tempo era
melhor”. Música, por exemplo. Sempre se ouve a geração dos pais dizer aos
filhos que a música moderna é uma porcaria, não tem letra, não tem melodia, que
as músicas antigas é que eram boas. Ora, música ruim havia até mesmo no tempo
de Mozart, por que na nossa geração não? Assim como hoje também há música boa,
sim.
O problema é que não queremos aceitar que a evolução e
a mudança são coisas boas e não ruins. Além de tudo, inevitáveis, não há como
fugir delas. Na nossa arrogância, não aceitamos que os jovens podem, sim, saber
mais e fazer melhor que nós. Que por
serem diferentes, terem outros ideais e gostos, não são piores nem melhores,
são apenas... diferentes.
Nós também mudamos. Não somos mais os jovens que
éramos naquele bendito nosso tempo, nem pensamos igual ao que pensávamos. E,
como diz a canção, estamos fazendo tudo como nossos pais.
Como nossos filhos farão, no futuro, e depois deles
nossos netos. A Humanidade é sempre igual, só mudam as datas.
O melhor, mesmo, é nos apropriarmos de todos os
tempos: o nosso, o dos nossos pais, filhos, netos, tirando deles o que eles têm
de melhor e misturando qual os ingredientes de um bolo, fazendo com que a nossa
vida cresça em vez de murchar, tornando-se cada vez mais doce.
Espero que o meu tempo não tenha passado, mas que
ainda esteja começando a chegar...
Concordo e acho mesmo que o nosso tempo é agora. O leite entornado está e cada um com sua nata tentando nadar para o lado menos gordo em busca de uma vida cada vez mais saudável. Talvez esta seja a marca registrada do novo tempo, enquanto outras etapas evoluem ou se repetem de acordo com o gosto de cada um. Parabéns pela crônica1
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